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domingo, 18 de setembro de 2011

A CHUVA










A CHUVA


Na verdade a vida é uma dualidade. Temos o côncavo e o convexo e não fora assim, não haveria perpetuação da espécie...ou o malabarismo não seria para qualquer um, se é que me entendem.
Temos ainda o alto e o baixo, gordo e o magro, o preto e o branco, o feio e o bonito e finalmente os que querem e os que torcem contra.
Há um bom tempo que não chovia, a estiagem estava a destruir as plantações. Dava pena de ver os caroços de algodão se abrindo e o seu fruto secando sob a ação de um sol inclemente. A alface, quando colocava a carinha para fora, já era aniquilada ao lado do pé de almeirão que lhe fazia companhia na horta.
A freqüência às minhas domingueiras foi aumentando a tal ponto que o pároco temia não haver lugar para todas as suas ovelhas se acomodarem.
Não resistindo mais àquela situação a providência in extremis foi fazer a novena que exigia mais sacrifício dos seus participantes.
Munidos de grandes baldes ou outras vasilhas, os fiéis desceriam a grande ribanceira indo até o rio, rezariam dois rosários inteiros acompanhados de todas as canções sacras e depois subirem o grande aclive com as vasilhas cheias de água, apoiadas em rodilhas de pano no alto da cabeço ou nos ombros.
Não era raro alguém sucumbir ao cansaço e sair rolando ladeira abaixo, esparramando a água e colocando em risco todo o esforço dos participantes, pois o líquido seria para lavar o cruzeiro em frente da igreja.
Qual o motivo de tamanho sacrifício?
Acreditavam piamente que choveria, pois coincidência ou não, às vezes chovia.
Eles queriam que chovesse, precisavam da chuva.
-Pedrão, oia lá. A beataiada começou a rezar pra chover.
-Uai, a gente devia estar lá também, estamos precisando de chuva.
-Precisando de chuva o cacete, seu Zé mané.Dá uma olhada onde a gente mora. Veja só onde estão as nossas casas. Se a chuva vier no tamanho exato da novena toda a encosta vai rolar. Vai ser pedra sobre pedra e quero que a maior caia em cima de tu, seu cabra safado.
Eles não queriam, não precisavam de chuva.
Com a palavra o bom Deus. Ele que resolvesse a dualidade da vida que Ele mesmo criou.

Hamilton Brito, participante do curso de crônicas ministrado pelo professor Pedro, no Senac.

5 comentários:

Cecilia Ferreira disse...

Que beleza!! Um orgulho pro GE da AAL. É isso, singeleza conteúdo, e um saltinho de gato pra botar maravilha no olho do que lê. Eis um elogio sem economia!

Unknown disse...

Parabéns por estudar literatura dessa forma...Vc é um grande escritor e um grande homem. A vida é mesmo pura dualidade...

Rita Lavoyer disse...

Lembro-me de uma canção que ainda me faz chorar .
" Para mim a chuva no telhado
é cantiga de ninar,
mas o pobre meu irmão,
para ele a chuva fria
vai entrando em seu barraco
e ..."
Emocionante.

Anônimo disse...

"Chove chuva,chove sem parar, pois eu vou fazer uma prece a Deus nosso senhor para a chuva parar de molhar o meu amor"
É de acordo com a pregação de Cristo, devemos amar nossos irmãos como a nós mesmos, portanto vamos em prece pedir a Deus que ilumine os governantes para um política mais sadia, melhorando a renda per capita para não termos de ver o destino de nossos pobres irmãos em barracos a beira de montanhas.

Cidadão Araçatuba disse...

Grande Zé!
Deus ás vezes ouve mesmo a "beataiada" e manda chuva, e da grossa, daquelas que destroem uma cidade inteira.
A dualidade? As pessoas enchem seus "espíritos" de fraternidade e começam tudo de novo, só que agora, umas ajudando as outras, ou não, afinal somos seres humanos, não é?

Excelente o seu texto, apenas brinquei com as palavrinhas nesse comentário. Grande Abraço!