Meu primeiro livro virtual

sexta-feira, 19 de março de 2010

SILHUETA





Divagar, estar em devaneio, deixar que o pensamento voe, fazer abstrações e ficar por ai, sem saber precisamente onde até chegar a determinado ponto.
E assim, imaginando, flutuando de quimeras em quimeras, fui parar em um tempo distante , no qual a quimera de então deixou de ser o sonho e se transformou na realidade dos dias atuais.
Era uma cidade pequena mas dotada de grande beleza, uma rua tranqüila onde a garotada jogava pião, fazia” guerrinha” com mamona, atirada com estilingue e brincava de esconde-esconde, até que alguém gritasse ser a hora do banho e do jantar.
O menino de então se transforma em um adulto, chefe de sua própria família mas não repete o que os seus pais faziam nas tardes quentes e por um único motivo: não há mais crianças nas ruas, as brincadeiras são outras e geralmente in door, até porque não dá para brincar carregando um computador e sem ele...
A cor morena e a pele queimada pelo sol, o esparadrapo no joelho protegendo o ferimento conseguido na “ pelada” na rua, as camisas rasgadas com seus botões perdidos , não mais se vê. Hoje, o computador e os seus jogos, confinam nossas crianças em quartos abafados durante horas e os corpos malhados e másculos deram lugar aos macilentos e arredondados de hoje.
-O que o senhor faz para evitar que os seus filhos façam isso?
-Quer saber mesmo? De verdade?
Nem no terreno da malícia, daquela sacanagenzinha que acontecia nas brincadeiras , nas quais havia amigas e amigas das amigas, as brincadeiras de médico, esconde-esconde onde os “pega aqui”, “ estica ali” aconteciam; nem o pé-de-ouvido ou o chute na bunda, vindo de algum pai ou irmão mais velho, acontece mais. A inocência de antigamente foi substituída pelo “ ficar” escancarado dos dias de hoje
-Inocência, o cara de pau?.
Mas uma lembrança...
Onde ela andará?
Era moreninha, muito da lindinha, corpo se formando mas já deixando vislumbrar o mais lindo poema da criação, olhos mais para o verde e o jeito inocente de olhar e de sorrir...e era brava que só ela.
Um domingo, na matinê, consegui permissão para sentar-me ao seu lado; tudo ia bem, até na mão eu peguei. “ Sem querer” toquei o seu joelho... nem a bomba de Hiroxima fez tanto barulho. Primeira descompostura pública da minha vida e um ano “ di mau”.
Hoje sou adulto e me pergunto: eu a amei um dia? Se não era amor, porque é só dela que eu me lembro ? Eu a amaria hoje?

Não sei como ela é...Então dou a resposta, sem vacilar:
-Sim, eu a amaria.
Quando o devaneio se prolonga, fecho os olhos e vejo o que poderia ser hoje, a sua silhueta.
E reitero:
-Sim, eu a amaria.

Hamilton Brito, membro do grupo experimental da academia araçatubense de letras.

2 comentários:

Marisa Mattos disse...

Quem sabe valesse apena procurá-la......

Rita Lavoyer disse...

É verdade. Descreve muito bem a distancia que nos separa desta civilização com aquela realidade humanizada. Lembro-me das mamonas. Doía pra caramba.
Um dia um japonês(inho) se irritou. Trocou as mamonas por uma pedra. Desgraçado de um -inho-, não errou a mira. Foi bem no rosto. Doeu pra burro.